segunda-feira, 19 de maio de 2014

SÉTIMA ARTE EM DESTAQUE: UMA VIAGEM EXTRAORDINÁRIA

POR GABRIEL JOSÉ
Estudante de Cinema da UESB

Adaptado do livro de ReifLarsen por GuillaumeLaurant e o próprio Jean PierreJeunet, “Uma Viagem Extraordinária” – primeiro trabalho de Jeunet falado em inglês desde “Alien: A Ressurreição” – conta a história de T.S. Spivet (Kyle Catlett), um garoto prodígio de 10 anos que inventou uma máquina de movimento perpétuo (a invenção serve como uma linda metáfora sobre a vida) e, graças à façanha, ganhou um importante prêmio e é convidado para recebê-lo em uma cerimônia na capital dos EUA. Contudo, Washington D.C fica do outro lado do país e, para não preocupar seus pais, que ainda estão lidando com a morte de seu irmão mais novo, decide sair da fazenda em uma viagem solitária.


Engana-se quem pensa que esse é um pequeno roadmovie sobre um garoto em busca de sua realização pessoal. T.S. não sai de casa por causa do prêmio ou para que a família comece a valorizá-lo, ele foge da recente dor causada pela morte do irmão, sentindo-se responsável pela tragédia. É o estágio da negação e isolamento. A mãe, a Dr. Clair (Helena Bonham Carter), mergulha nos estudos sobre insetos; o pai (Callum Keith Rennie) não consegue demonstrar o mesmo carinho que tinha pelo outro filho; a irmã Gracie (Niamh Wilson) só pensa em se tornar famosa; e T.S. sente-se cada vez mais sozinho e sem ninguém para compartilhar seu sofrimento, e vê na viagem uma oportunidade de deixar tudo para trás.


Jeunet é conhecido por clássicos cults como “O Fabuloso Destino de AméliePoulain” e “Delicatessen”. “Uma Viagem Extraordinária” segue na linha de “Amélie” (e não seria diferente com a participação de Laurant), com um humor suave e personagens carismáticos. Durante a viagem, T.S. encontra vários tipos interessantes, como o mendigo TwoClouds (Dominique Pinon marcando presença em mais um filme do diretor) que mora em um vagão de trem, um caminhoneiro fotógrafo, um policial trapalhão, sempre pessoas inofensivas. Desde modo, T.S. nunca fica em perigo de chegar ao seu destino. Ou pelo menos o perigo que ele poderia encontrar na vida real, pois, como a protagonista Amélie, o principal conflito não está no exterior e sim no interior do personagem.

A morte não é o único tema tratado no filme. O diretor também reserva tempo para criticar o mundo superficial do entretenimento. A crítica pode ser vista na personalidade de Gracie e sua valorização da aparência, e também no terceiro ato, que poderia ter sido melhor trabalhado. Quando o filme atinge seu auge emocional (o momento da aceitação) em um belo discurso de T.S. (que já seria um excelente final), Jeunet opta por quebrar o ritmo para criar “vilões” desnecessários e unir a família de uma forma mais divertida, deixando a tristeza de lado. Já que é melhor, comercialmente, deixar o público com um sorriso no rosto do que uma lágrima. Outros temas que podem gerar discussões é a descrença dos adultos com o potencial das crianças e a liberação de armas de fogo, mas isso só para o público mais entusiasmado em desconstruir o filme.

Mesmo com a insistência em fazer um filme família, Jeunet é competente ao envolver o público nesta emocionante história, até tendo um momento “Wes Anderson” quando derruba a quarta parede para mostrar a preparação de T.S. para a viagem. Com uma equipe de produção de alto nível, a trilha sonora de Denis Sanacore entrega todo o clima de melancolia que a trama pede, com inspiradas melodias de violão e gaita. Thomas Hardmeier mantém a fotografia familiar dos filmes de Jeunet, com a predominância do verde, vermelho e dourado, muito vivos, criando imagens que fariam qualquer exposição de arte um sucesso. A edição de HervéSchneid está bem inventiva, com bastante hipertexto e, trabalhando junto com o departamento de arte (os créditos finais são a cereja do bolo), colabora em dar leveza e dinamismo à história. Uma pena que trabalhos assim acabam chamando muita atenção para si, mas nada que prejudique demais o resultado final.

“Uma Viagem Extraordinária” é uma história delicada, emocionante e divertida. Contudo, ela seria melhor se fosse menos “divertida”, principalmente no final, e focasse nas consequências que a morte causou nos personagens e a relação deles com o luto, como DarrenAronofsky fez em “Fonte da Vida”. Seria um caminho mais difícil, porém o prêmio seria recompensador 

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