domingo, 6 de setembro de 2015

SÉTIMA ARTE EM DESTAQUE: O PEQUENO PRÍNCIPE


POR GABRIEL JOSÉ
Estudante de Cinema da UESB


Poucas obras tocaram tantas pessoas quanto “O Pequeno Príncipe”, lançada em 1943. A leitura do relativamente curto livro de Antoine de Saint-Exupéry tornou-se uma daquelas experiências essenciais da infância. Portanto, qualquer filme que lide com uma história tão querida corre sério risco de alienar seu público caso não respeite o original.



Não é surpresa, portanto, que os melhores momentos desse longa animado homônimo, dirigido por Mark Osborne (“Kung Fu Panda“), sejam aqueles que adaptam com extrema fidelidade a trama de Saint-Exupery, trazendo à vida até mesmo as ilustrações do autor. É uma pena que tais momentos sejam tão efêmeros e representem menos de 1/3 da projeção.

Escrito por Irena Brignull (“Os Boxtrolls“) e Bob Persichett, o foco dessa produção não é a história do livro em si, mas no impacto que este tem em uma menininha, cuja perfeccionista e controladora mãe tem planejada toda a sua vida, minuto a minuto, sem margem para imaginação ou amigos, lidando apenas com números frios e objetivos profissionais. Isolada em uma casa fria e rígida, a menina tem sua rotina invadida por um velho aviador, que lhe conta de seu encontro com o Pequeno Príncipe, trazendo assim cor e alegria à vida da criança.


Apesar de a menininha ser a protagonista do filme, o coração desta produção é realmente o Pequeno Príncipe, algo inclusive refletido no design de produção. Ora, enquanto as cenas da menininha são mostradas em uma animação computadorizada comum (embora deveras competente), as cenas que mostram as passagens do livro são feitas em uma belíssima mistura de CG e stop-motion.

Deste modo, os queridos personagens literários ali retratados, como o próprio Pequeno Príncipe, o aviador e a rosa, se mostram mais “tangíveis” e “reais” do que aqueles que deveriam representar o público. O fato de que os traços dessas figuras tenham sido retirados diretamente das ilustrações de Saint-Exupéry ressalta a ideia de que elas parecem ter pulado diretamente das páginas do livro. Até mesmo a fotografia nas cenas do deserto, em um tom puxado pro sépia, ressaltam um sentimento gostoso de nostalgia.

Esses trechos são mostrados de maneira delicada e fiel, com todas as agridoces lições do original sendo retratadas com extrema fidelidade, mantendo-se inclusive o tenso último diálogo entre o Príncipe e o Aviador (e a reação da menina ao ouvir esse trecho específico é a melhor cena do “mundo real”, refletindo a reação de muitos leitores nessa passagem).

Enquanto a mãe é excessivamente vilanizada no segundo ato, a figura estóica do aviador é reduzida, quando no “mundo real”, a um senhor atrapalhado e irresponsável, o que iguala a lição de maravilhamento e o eterno olhar infantil que o Pequeno Príncipe transmite (literal e/ou figurativamente) ao personagem/autor a um incentivo de eterna imaturidade, prejudicando o filme como um todo.

No entanto, esse dano foi menor que aquele causado pelo desastroso terceiro ato da produção, no qual a fita torna-se uma sequência do livro. Pior, uma continuação extremamente convencional, apresentando o Príncipe em uma versão adulta apoiada em um humor físico (!) dos mais comuns, despindo a trama de todo o charme que a tornava única.


No final, “O Pequeno Príncipe” é uma produção tão linda quanto problemática, dotada de um visual magnífico, uma bela trilha sonora composta por Hans Zimmer e Richard Harvey, mas que só mostra sua alma quando os trechos do livro original ganham a telona, mostrando-se vazio e comum quando tenta ser “original”. Antoine de Saint-Exupéry salvou o filme de ser uma catástrofe.

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