POR GABRIEL JOSÉ
Estudante de Cinema da UESB
Sou da opinião de que nunca se deve dar a carreira de um grande artista por encerrada. Por mais que trabalhos recentes decepcionem, quem um dia realizou uma obra de verdade pode, a qualquer momento, voltar a fazê-lo. Ridley Scott é um bom exemplo dessa teoria. Embora responsável por clássicos do cinema na segunda metade do século XX, o cineasta britânico jamais foi capaz de manter uma regularidade em sua filmografia, oscilando entre produções de indubitável qualidade e outras de gosto bastante duvidoso – para não dizer ruins. Mas nunca se deve dar a carreira de um grande artista por encerrada, e Scott mostra isso mais uma vez ao realizar, Perdido em Marte, (The Martian, 2015),seu melhor trabalho desde Gladiador.
É o filme de maior bilheteria dos indicados ao Oscar de melhor filme desse ano. Perdido em Marte é um filme que reserva uma boa parcela de surpresas mais em função da própria abordagem de Scott do que pelo enredo, que segue por caminhos fáceis de prever. A principal dessas surpresas talvez seja o tom de leveza com que o roteirista e o diretor encaram o material; seria fácil transformar a história de um homem sozinho em um planeta distante em um conto sombrio e reflexivo, mas não é o que ocorre. Perdido em Marte é uma produção surpreendentemente divertida, com diversas passagens eficazes de humor, e ágil, não obstante as mais de duas horas de duração.
Mas Perdido em Marte é um filme de Matt Damon. Se não se pode dizer que é um show-de-um-homem-só – como foi o caso de Sam Rockwell em Lunar,, uma vez que a narrativa exibe ao mesmo tempo os acontecimentos da Terra e da nave, não seria equívoco algum creditar o sucesso da produção ao talento do ator. Surgindo quase sempre sozinho em cena, Damon demonstra o seu alcance dramático ao transmitir eficientemente toda a gama de emoções vivida por Watney, especialmente sua incontestável determinação. O personagem é prático: ele entende que não há tempo para lamentar, portanto, age. Assim que acorda do acidente que dá início ao filme, por exemplo, prontamente retorna à base e cuida do ferimento, sem qualquer choro de sua parte. Damon passa essa força e esse otimismo de forma completa, sem deixar de lado o bom humor tão fundamental para o público abraçar o protagonista, e que resulta em alguns dos momentos mais divertidos do filme . Matt , faz jus a sua indicação ao Oscar de melhor ator.
Longe de ser um filme de ação como foi vendido, Perdido em Marte é uma espécie de híbrido entre Náufrago (Cast Away, 2000) e Apollo 13 (idem, 1995), acrescentado de alguns toques cômicos (a piada com Sean Bean e O Senhor dos Anéis merece destaque). Trata-se de um belo exemplar do cinema comercial norte-americano, capaz de combinar espetáculo e inteligência na medida certa, ainda encontrando espaço para momentos mais contemplativos, como o de Mark Watney sentado em uma duna de Marte observando o horizonte. Porém, acima de tudo, é a prova de que um artista comprovadamente talentoso sempre tem a arte dentro de si, embora nem sempre consiga exprimi-la em toda sua forma.
Nenhum comentário:
Postar um comentário