sexta-feira, 27 de março de 2015

SUSTENTABILIDADE NA NUTRIÇÃO É FOCO DE CAMPANHA NACIONAL ORGANIZADA PELO SISTEMA CFN/CRNs



POR CARLA SANTANA
Assessoria de Comunicação

“Sustentabilidade e Nutrição. Alimente esta ideia. O planeta agradece”. Este é o slogan da campanha anual que o Sistema Conselho Federal e Conselhos Regionais de Nutricionistas (CFN/CRN) vai lançar no Dia Nacional da Saúde e Nutrição, 31 de março, em todo o Brasil. O objetivo é despertar não apenas a categoria representada pelas entidades, mas sobretudo a sociedade, para a importância da adoção de práticas sustentáveis relacionadas à alimentação e à nutrição.

Segundo a presidente do Conselho Regional de Nutricionistas da 5ª Região (CRN-5 - Bahia e Sergipe), Valquíria Agatte, durante todo o ano, a partir de agora, serão realizadas ações voltadas à conscientização das pessoas em relação aos riscos dos agrotóxicos, aos benefícios do consumo de orgânicos, às possibilidades de aproveitamento integral dos alimentos, às variadas formas de combate ao desperdício de água e à influência dos transgênicos na sustentabilidade do planeta. 


“Queremos a maior adesão possível de Nutricionistas, Técnicos em Nutrição e Dietética e da população em geral à campanha. Por isso, estamos planejando para este ano diversas ações, tais como realização de Caminhada aberta ao público, feira orgânica, ato público nas assembleias legislativas da Bahia e Sergipe e nas Câmaras Municipais de Vereadores de Salvador e Aracaju, entre outras. Institucionalmente, ao longo de 2015, também teremos boletins especiais, entrevistas, postagens em nossa Fan Page, realização de chat temático e publicação de conteúdos específicos sobre o tema em nosso site (www.crn5.org.br)”, anunciou Agatte. 

Luta contra os agrotóxicos

A resistência da sociedade civil ao uso de agrotóxicos em todo o mundo, baseada no movimento de agricultura alternativa, é histórica. Recentemente, o movimento mais organizado no Brasil se dá através da Campanha Nacional contra os Agrotóxicos e pela Vida, que reúne mais de 200 entidades, além de movimentos sociais, ONGs e órgãos de Estado como a Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). 

O Brasil é o líder do ranking mundial de consumo de agrotóxicos, fato diretamente relacionado à atual política agrícola do país, baseada no agronegócio. Este modelo de produção se caracteriza pela concentração de terras, monoculturas e utilização de enormes quantidades de veneno para garantir a produção em escala industrial. 

Segundo dados reunidos pelos organizadores da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, os ingredientes ativos presentes nos agrotóxicos podem causar esterilidade masculina, formação de cataratas, reações alérgicas, distúrbios neurológicos, respiratórios, cardíacos, pulmonares, no sistema imunológico e no sistema endócrino, ou seja, na produção de hormônios, desenvolvimento de câncer, dentre outros agravos à saúde. 

“Precisamos apoiar a luta contra a ameaça que representam os agrotóxicos, denunciando os seus efeitos degradantes à saúde (tanto dos trabalhadores rurais como dos consumidores nas cidades) e ao meio ambiente (contaminação dos solos e das águas)”, incentiva a nutricionista Zelice Pessoa, conselheira do CRN-5.

“É preciso restringir, no Brasil, os agrotóxicos já banidos em outros países, realizar estudos de impacto ambiental no uso das sementes transgênicas, impedir a expansão do uso dos agrotóxicos, além de reafirmar e reforçar o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PLANAPO) e outros marcos legais. Nós, nutricionistas e profissionais comprometidos com o bem estar da população, podemos aderir a esta luta, levando  informação à sociedade a respeito da presença de agrotóxicos nos diversos tipos de alimentos, inclusive os processados, estimular debates nos locais de trabalhos sobre os impactos nutricionais do uso de agrotóxicos e fomentar ações que possam dar o panorama dos benefícios para nossa saúde, no fortalecimento dos sistemas de produção de base agroecológica”, defende Zelice

Atualmente, há inúmeras evidências da capacidade produtiva da agroecologia, com impacto positivo para o solo, água, bioma e aumento da lucratividade para as famílias. “O sistema do agronegócio, para funcionar, utiliza elevado financiamento público, com um custo de 40% na compra dos insumos químicos para a produção”, destaca a conselheira do CRN-5. 

Orgânicos em alta

Diante da divulgação crescente dos malefícios dos agrotóxicos, o consumo de alimentos orgânicos tem sido incentivado por diversos grupos e entidades. Isso porque este tipo de alimento utiliza em seus processos de produção técnicas que respeitam o meio ambiente e preservam a saúde. Neste sentido, não são usados agrotóxicos nem qualquer outro tipo de produto que cause dano a saúde dos consumidores. 

Na agricultura, por exemplo, utiliza-se apenas métodos naturais para combater pragas e fertilizar o solo. No tocante à produção de carnes e ovos, os animais são criados sem a aplicação de antibióticos, hormônios ou anabolizantes. Tais produtos podem provocar doenças nos seres humanos, quando consumidos por muito tempo. 

Segundo a nutricionista Janaína Queiroz, conselheira do CRN-5, “a produção de alimentos orgânicos não só gera saúde como também respeita o meio ambiente, evitando a contaminação do solo, da água e da vegetação. Além disso, utiliza sistemas de responsabilidade social, principalmente na valorização da mão-de-obra”, destaca.

Embora apresentem praticamente as mesmas propriedades nutricionais dos alimentos inorgânicos, os orgânicos apresentam a vantagem de seres mais saudáveis, pois não possuem agrotóxicos, além de serem mais saborosos.  A única “desvantagem” dos orgânicos é que ainda são mais caros do que os convencionais, seja porque são produzidos em menor escala, seja pelos custos de produção ou, ainda, pelo desequilíbrio entre oferta e demanda (questões mercadológicas). 

“Recomendamos que, na medida do possível, as pessoas procurem as feiras agroecológicas e comprem diretamente dos produtores. Vale a pena pesquisar e pechinchar. O Instituto de Defesa dos Direitos do Consumidor (IDEC) tem, em seu site, um mapa das feiras agroecológicas do Brasil, onde o cidadão pode descobrir onde tem uma feira mais próxima da sua casa. Basta acessar feirasorganicas.idec.org.br”, informa Janaína Queiroz.

Não ao desperdício!

O impressionante volume de 1,3 bilhão de toneladas de alimentos desperdiçados anualmente em todo o mundo não só causa grandes perdas econômicas como também tem impacto significativo nos recursos naturais que a humanidade utiliza para se alimentar. A cada ano, os alimentos produzidos e não consumidos utilizam um volume de água equivalente ao fluxo anual do rio Volga na Rússia e são responsáveis pela emissão de 3,3 milhões de toneladas de gases de efeito estufa na atmosfera do planeta.

De acordo com estudos da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), 54% do desperdício de alimentos no mundo ocorre na fase inicial da produção, manipulação pós-colheita e armazenagem. Os outros 46% ocorrem nas etapas de processamento, distribuição e consumo. Geralmente, os países em desenvolvimento sofrem mais com as perdas durante a produção agrícola, enquanto o desperdício na distribuição e consumo tende a ser maior nas regiões de renda média e elevada.

Para resolver o problema, um manual prático da FAO detalha três níveis onde são necessárias ações. Em primeiro lugar, é preciso reduzir as perdas resultantes de más práticas nas atividades rurais. Em segundo, no caso dos excedentes alimentares, a melhor opção é a reutilização dos alimentos na cadeia alimentar humana, através de mercados secundários ou da doação aos membros mais vulneráveis da sociedade. Se os alimentos não estão em condições para o consumo humano, vale a pena desviá-los para a cadeia alimentar animal, poupando recursos que, de outra forma, seriam necessários para produzir ração comercial. 

Por fim, quando a reutilização não é possível, deve proceder-se à reciclagem de subprodutos (digestão anaeróbia, compostagem e incineração) com recuperação de energia e de nutrientes provenientes do desperdício, o que representa uma vantagem significativa em relação aos aterros. Nesses, os restos de alimentos que acabam por apodrecer são responsáveis por uma elevada produção de metano, um gás com efeito estufa bastante prejudicial.

Segundo a nutricionista Zelice Pessoa, conselheira do CRN-5, incentivar o aproveitamento integral dos alimentos é outra medida eficaz no sentido de evitar perdas, já que partes, que geralmente não são aproveitadas possuem bom valor nutricional e podem ser utilizados sem prejuízo na qualidade, sabor e segurança. Exemplos de partes de alimentos que geralmente não são aproveitadas, mas que poderiam ser, são a nata do leite: as cascas de batatas, bananas, laranjas, pepino e abacaxi; talos de couve-flor, brócolis e beterraba; entrecascas de melancia e maracujá; sementes de abóbora, melão e jaca, entre outras. “Há uma variedade enorme de receitas nutritivas que utilizam esses elementos como ingredientes”, destaca.

Falta d’água 

Se o assunto é água, embora o Brasil seja um país privilegiado (sozinho, detém 12% da água doce de superfície do mundo), falta água no semiárido e nas grandes capitais, porque a distribuição desse recurso é desigual. Cerca de 70% da reserva brasileira de água está na Região Norte, onde vivem menos de 10% da população. A situação pode ser pior nas regiões populosas, nas quais o consumo é maior e a poluição das indústrias e do esgoto residencial reduz o volume disponível para o uso. É o caso da bacia do rio Tietê, na região metropolitana de São Paulo, onde os habitantes têm acesso a um volume de água menor do que o recomendado para uma vida saudável. 

Diante da redução dos níveis dos reservatórios das grandes cidades brasileiras, muito se tem falado sobre desperdício e utilização racional da água. Neste sentido, é preciso considerar que o consumo humano em  hábitos básicos como saciar a sede, banhar-se, lavar roupa e cozinhar é relativo e pode variar muito, dependendo, inclusive, de aspectos culturais da população. Alguns estudos mostram que, por dia, o brasileiro gasta de 50 a 200 litros de água. Reduzir este índice depende de diversos fatores mas, principalmente, da forma como o recurso é usado.

As maiores vilãs do desperdício nas instalações prediais são as válvulas convencionais de descarga. Cada segundo que uma pessoa permanece com o dedo na descarga são dois litros de água desperdiçados. Entretanto, esse consumo é pequeno se comparado aos 1.650 litros de água para produzir 1 kg de soja, 1.900 para 1 kg de arroz, 3.500 para 1 kg de aves e 15 mil para 1 kg de carne bovina. 

O mesmo ocorre com produtos industrializados. São 10 litros de água para 1 de gasolina, 95 para 1 kg de aço, 324 para 1 kg de papel e 600 litros para 1 kg de cana-de-açúcar voltada para a produção do etanol. Na agricultura, o desperdício de água também é muito grande: apenas 40% da água desviada é efetivamente utilizada na irrigação. 

No sistema de abastecimento também se perde muita água. Além dos vazamentos, há de se considerar a água usada pelos consumidores, mas que não é medida pela empresa de abastecimento de água, como as ligações clandestinas e outros tipos de fraudes. A perda total nos sistemas públicos de abastecimento do Brasil equivale, em média, a 45% da água produzida. 

Finalmente, vale destacar que a conservação da água depende, sobretudo, de ações educativas junto à comunidade, que deve ser esclarecida com relação à necessidade de redução dos desperdícios. Entre as dicas práticas que devem ser propagadas neste sentido, destacam-se: checar e controlar vazamentos; aproveitar água da chuva para molhar plantas; fechar a torneira enquanto escova dentes ou faz a barba; substituir mangueira por baldes na hora de lavar pátios e carros; reaproveitar água da máquina para lavar a calçada e reduzir o tempo do banho.

Alimentos Transgênicos e a (in)sustentabilidade

Os transgênicos, ou organismos geneticamente modificados, são produtos de cruzamentos que jamais aconteceriam na natureza, como, por exemplo, arroz com bactéria. Por meio de um ramo de pesquisa relativamente novo (a engenharia genética), fabricantes de agroquímicos criam sementes resistentes a seus próprios agrotóxicos, ou mesmo sementes que produzem plantas inseticidas. As empresas ganham com isso, mas o consumidor e o meio ambiente podem pagar um alto preço.

Embora os estudos e resultados científicos sobre os riscos dos transgênicos ainda sejam inconclusivos ou insuficientes, há uma infinidades de entidades e grupos organizados que garantem: o modelo agrícola baseado na utilização de sementes transgênicas é a trilha de um caminho insustentável. A justificativa para esta afirmação é a de que o aumento dramático no uso de agroquímicos decorrentes do plantio de transgênicos coloca em cheque o futuro dos solos e da biodiversidade agrícola, além de possibilitar a extinção de sementes nativas.

Segundo organizadores do Greenpeace, organização global e independente que atua para defender o ambiente, diante da crise climática mundial, a preservação da biodiversidade funciona como uma garantia de que haverá opções viáveis de produção de alimentos no futuro. Nesse cenário, afirmam, “os transgênicos representam um risco porque por serem resistentes a agrotóxicos ou possuírem propriedades inseticidas, o uso contínuo de sementes transgênicas leva à resistência de ervas daninhas e insetos, o que por sua vez leva o agricultor a aumentar a dose de agrotóxicos ano a ano”. 

Segundo o nutricionista Emerson Palmeira, conselheiro do CRN-5, um bom exemplo de alimento importante, que hoje se encontra em ameaça pelos transgênicos, é o bom e tradicional arroz. “Não existe consenso na comunidade científica sobre a segurança dos transgênicos para a saúde humana e o meio ambiente. Testes de médio e longo prazo, em cobaias e em seres humanos, não são feitos em base epidemiológica ou com uma amostra com significância estatística e geralmente são repudiados pelas empresas produtoras de transgênicos. Quando isso envolve um alimento como o milho, base do consumo alimentar em nosso país, estamos correndo sérios riscos”, diz.

Vale destacar que em 2003, foi publicado o decreto de rotulagem (4680/2003), que obrigou empresas da área da alimentação e produtores de alimentos a identificarem com um “T” preto, sobre um triângulo amarelo, o alimento com mais de 1% de matéria-prima transgênica. Segundo o Greenpeace, “a resistência das empresas foi muito grande e muitas permanecem até hoje sem identificar a presença de transgênicos em seus produtos”.  

Sobre este aspecto, o nutricionista Emerson Palmeira defende que a rotulagem de produtos transgênicos é um direito básico dos consumidores. “Todos nós temos o pleno direito de saber o que consumimos! Basta tentar encontrar no supermercado um saco de flocos de milho ou uma garrafa de óleo de soja que não seja de origem transgênica e pemosrceb a dificuldade de encontrar. Isso só é possível porque temos a rotulagem obrigatória. Toda e qualquer iniciativa de retirar a obrigatoriedade da identificação dos transgênicos deverá ser combatida”, diz. Vale destacar que a produtividade dos transgênicos não é superior a dos convencionais e orgânicos, sendo a semente transgênica mais cara por conta dos royalties a serem pagos, o que aumenta o custo de produção. Vale considerar, ainda, a dependência dos produtores, tendo em vista que as plantas não se reproduzem e por isso eles precisam comprar mais sementes para o replantio.

Apesar dos incentivos à adoção de transgênicos, camponeses estão se conscientizando para a adoção de práticas sustentáveis. Exemplo disso é o trabalho do Movimento Camponês Popular com variedades crioulas, visando o aumento da biodiversidade local e práticas agroecológicas de cultivo. “A conservação das sementes crioulas promove a soberania alimentar dos povos, que adquirem a posse das sementes, não necessitando comprá-las”, explica Emerson Palmeira. O nutricionista destaca, ainda, que as sementes crioulas podem produzir mais alimentos com menos custos do que sementes híbridas ou transgênicas. “Elas produzem alimentos mais saudáveis, contribuem para a preservação ambiental, podem se adaptar melhor à região nativa e são mais independentes ao uso de tecnologia”, completa.

Uma das promessas recentes dos defensores dos alimentos transgênicos é a criação de sementes geneticamente modificadas resistentes à seca. “Mas já sabemos que quem está tendo mais êxito em enfrentar o problema da estiagem prolongada são os agricultores que construíram suas cisternas para armazenar água da chuva, cultivam sementes crioulas e vêm diversificando a produção. Assim, temos o desafio de incentivar a ampliação e o acesso das sementes crioulas pela agricultura familiar, documentando a superioridade dessas variedades, sobretudo no contexto de seca. Os governos precisam investir em programas e políticas de fomento à agrobiodiversidade”, conclui o conselheiro do CRN-5.

Mais informações para a imprensa podem ser obtidas com 
a jornalista Carla Santana pelo telefone  (71) 8890-7023




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