quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

FILMES INESQUECÍVEIS: UM SONHO DE LIBERDADE



POR GABRIEL JOSÉ
Estudante de Cinema da UESB

Do que poderia ser a pior das negações da vida, a prisão é forma de punição encontrada pelo Estado para àqueles que transgridem a lei, a moral e a ética, estas que historicamente originam-se de conceitos civilizacionais que encontram fundamentos na tradição de culturas religiosas, curiosamente como a concepção da ideia de “redenção”, esta que dá o título original a este filme. Algo que muitos filósofos modernos consideram um equívoco, tal como a muito influente romancista e filósofa AynRand, que defende que o código do bem e do mal do homem, com as conotações emocionais de elevação, enaltecimento, nobreza, reverência, grandiosidade pertencem somente ao universo dos valores do homem, os quais, segunda a autora citada, a religião indevidamente se apropriou.

Um Sonho de Liberdade  (The ShawshankRedemption, 1994) é um filme imensamente popular e que sobreviveu com louvor aos tempos. É um clássico do cinema. Adorado, televisionado, revisto, presente nos tops de cinéfilos, bem avaliado por público e crítica. No entanto, eis um filme de prisão –  o mais horrendo e temível destino de todo cidadão. Eleito por muitos o melhor filme de todos os tempos (o filme está atualmente em 1º lugar no TOP250 De Todos os Tempos do IMdb, que é o maior banco de dados sobre cinema do Mundo), este drama de prisão excede qualquer expectativa do espectador. Seja ela do tamanho que for.


Baseado no conto “Rita Hayworth e a Redenção de Shawshank”, publicado na coletânea Quatro Estações do escritor americano e Mestre do Terror Stephen King, o filme nada tem do terror marca registrada do autor da história, mas em compensação mostra que King é mestre de qualquer gênero. Antes de qualquer coisa, UM SONHO DE LIBERDADE é um drama comovente e surpreendente sobre o poder da amizade e da esperança.


O filme conta a história do inteligente banqueiro Andy Dufresne (Tim Robbins), que é acusado injustamente pelo assassinato de sua mulher e do amante dela. Julgado e condenado à prisão perpétua, Andy chega à temida prisão Shawshank. Seu jeito peculiar e contemplativo chama a atenção de Red (Morgan Freeman) um dos detentos mais experientes do local, e “contrabandista oficial” da prisão. O que começa como uma relação de “negócios” entre os dois, (já que Andy usa os serviços de Red para contrabandear alguns ítens), se torna uma forte amizade com o passar dos anos. Mas será que esta amizade pode sobreviver à opressão dos muros da prisão?

O filme é magistralmente dirigido por Frank Darabont, que na época das filmagens (1994) ainda não tinha nenhum nome em Hollywood. Seu filme mais ambicioso até então era o modesto mas esperto telefilme SEPULTADO VIVO. Mas contando com a confiança de King, Darabont mergulhou no projeto e entregou uma nova obra-prima do cinema, que lhe valeu o acesso à Hollywood, além de sete indicações ao Oscar daquele ano, incluindo Melhor Filme e Diretor.

Darabont voltou a adaptar obras de King ainda mais duas vezes no cinema. A primeira, À ESPERA DE UM MILAGRE, é outra obra-prima. E a segunda, O NEVOEIRO, apesar do orçamento modesto, é um dos melhores e mais efetivos filmes de Horror dos últimos tempos. O próprio Stephen King já disse que Darabont não só dirigiu as melhores adaptações de suas obras no cinema, como ainda por cima consegue entregar finais às suas obras melhores do que os finais escritos pelo próprio King nos livros.

Aqui ,Darabont toma seu tempo e entrega um filme que não se apressa em desenvolver seu tema, o que funciona que é uma maravilha em um filme de prisão. São várias tomadas belas e contemplativas, que se equilibram com maestria com os momentos dramáticos, o humor, e a mudança de tom na inacreditável meia hora final do filme. Por falar em final, quem ainda não conhece a história vai ficar boquiaberto com a inacreditável surpresa nos minutos finais do filme.

Além da sequência que guarda esta surpresa, o filme é recheado de sequências marcantes. Algumas até antológicas, como a cena em que Andy, sentado na sala do diretor, coloca a ópera de Mozart para tocar nos autofalantes da instituição para que os presos no pátio possam ouvir, numa sequência arrepiante de tão bela. As sequências que descrevem e mostram como funciona o esquema de lavagem de dinheiro que Andy desenvolve para o corrupto diretor da prisão (Bob Gunton, ótimo) também são geniais, e apesar de complexas, conseguem a façanha de não comprometer o ritmo do filme, numa mostra do talento e vocação de Darabont em adaptar a obra de King.

Tudo isso ainda é embalado pela narração na medida de Morgan Freeman, cujo mero tom de voz já alça o patamar de qualquer filme, e pela belíssima trilha-sonora incidental do mestre Thomas Newman, cujos acordes na emocionante sequência final do filme trazem lágrimas aos olhos de quem vê. Sequência que inclusive, não existia no conto de King.

UM SONHO DE LIBERDADE consegue a improvável façanha de ser um triste e carregado drama prisional durante praticamente toda sua duração, e em poucas sequências finais, se transformar um um belo ode à amizade embalado em uma cativante mensagem de esperança. É como se o filme fosse uma longa e tortuosa estrada cinza, que desemboca em um infinito mar azul, assim como a última imagem do filme.

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