domingo, 16 de novembro de 2014

CARTA DE AMÔ



POR NANDO DA COSTA LIMA

“Elvira meu amor, já faz mais de um meis que não boto o ôlho em você, aproveitei a solidão pra escrever essas mau traçadas linha. E apaxonado do jeito que tô ainda fiquei retado com Marinho, dono daquele bar que só toca música de corno beber conhaque, foi aquele linguarudo que me disse que viu você passeando no Bosque da Paquera à noite com aquele árabe com nome de marca de remédio, um tal de Chafik. Cheguei até a pensar em se suicidar mas desisti depois que me falaram que a única coisa que aquele metido a gostoso das arábias tem maior que eu é o nariz. Quero também te alertar pra não recebê nenhum presente daquele atravessadô de namôroro, principalmente se for um ramalhete de flô de plástico, o sujeitim é tão pão duro que usa essas flô desde 1975. É só conseguir levar as moça no papo que toma o arranjo de flô de volta já pra usar em outra conquista.

Tome cuidado, tem gente que fala que as flô é enfeitiçada, além disso estão tão melada de cocô de mosca que pode até passar uma doença ruim pra quem receber. Mas vamo deixar isso pra lá e falar de coisa bôa. Em premero lugar quero comunicá que Tião veio avisar do nascimento de Aviãozim, filho de minha égua melada. Meu filho com aquela muié que vou largar por você nasceu no mesmo dia, eu até quis botá o nome dele Pedro Avião em homenagem ao podim, mas a patrôa resolveu puxar o saco de um político famoso e o minino ficou sendo chamado de Zé Pedral da Silva. Mas isso não tem importância, o pió é a sordade matadeira que sinto do nosso namoro no Jardinho das Barbuleta, toda vez que ia dar comida pros pôrco lembrava de você, o cheiro é o mesmo do zoológico do jardinho onde nois se conhecemos, alembro até como foi: sua piruca canecalon importada caiu na jaula da onça pintada e por sorte eu tava perto e consegui pegar antes que a fera chegasse junto. Depois disso se apaixonamos perdidamente! 

Assim que você encaixou a piruca lôra nois foi pro Lindoya chupar picolé de côco e ver os minino sair da matinê, tava passando um filmaço. Depois que acabou o movimento a gente foi comer um acarajé em Aurelino, você comeu dois abará e cinco acarajé, foi ali que senti o seu primeiro sinal de amô, comeu muito pouco! De Aurelino nois subiu direto pro corêto do jardinho, a filarmônica tava tocando o hino de Conquista na hora que te dei o primeiro beijo. O hino ficou sendo minha musga preferida, até hoje não achei o disco pra comprar, procurei até em Sompaulo! Ficamo tanto tempo em pé olhando a filarmônica que a bota que Moreno tinha feito pra mim começou apertar meu dedão, cheguei a jogar praga naquele sacana por ter feito a bota dois número a menos… foi o jeito sentar e tirar a mardita. Você tava tão gamada que na hora que viu meu pé só aguentou botar a mão na cabeça e cair desmaiada, foi sua segunda prova de amô. O pessoal que tava por perto falô que foi meu chulé que quase te matou, mas era pura inveja! Meia e cueca eu troco toda semana. Você deve tá pensando que tô meio besta escrevendo coisa do passado, mas é que nois intelectuaus samos diferente, não gostamo de se sentir jogado pras barata. Por falar em abandono, aquele minino que Pedro achou na porta da venda que eu ensinei portuguêis e conhecimentos geral até completar quinze anos, passou num vestibular do interior de Minas. A mãe dele não cansa de falar que graças à minha cultura Uélito Júnio vai ser dotô adevogado.

Meu amô, termino esta carta falando do acidente que me aconteceu em frente ao Cine Ritz: minha égua melada deu um coice na porta da Aeruilis pretona de seu Jeremildes e eu acabei vindo parar no xadrez, a sorte foi que o delegado é meu padrinho e eu só tomei meia duzia de bôlo e peguei dois mêis de cadeia, mas assim que sair daqui vou dar fim nessa sordade e vortá a te encontrar no Jardinho das Barbuleta em frente à jaula da pintada (aquela que fede mais que jogo de camisa de time de futebol amador).

Tô contando as hora, sonhando com o dia que nossas dentaduras dormirão no mesmo copo. Seu criado Uóchinton Luiz Souto, esse humilde intelectual alfabetizado pelo extinto MOBRAL e hoje pós-graduado pelo TOPA (apaixonadiçimo)”.

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